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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Doma en la Fiesta del Chancho

Do centro de Salta, "La linda", un minibus tomado ao acaso leva ao campo, em direção à Cordillera. No semi-árido Noroeste Argentino, chegar a altitudes um pouco mais elevadas significaria encontrar água, verde e um panorama diferente da surpreendentemente familiar sequidão.
Perto do ponto final, com tanta e tão festiva gente dentro do onibus, "algo pasa"... Depois de uma breve caminhada com a multidão, chego à arena da II Fiesta del Chancho.
Chancho é um dos vários nomes que se dá ao porco/leitão. E na festa, além de muito chancho, tinha vino, gaseosa, humitas(algo similar a uma pamonha do sudeste do Brasil), mate, ponchos, caballos e gauchos.
Apesar de ja estar próxima à transição com os Andes, Salta ainda mantém este tipo de manifestação cultural, típica do povo gaucho que, longe de restrito ao Rio Grande do Sul no Brasil, está distribuído em toda a enorme planície que inclui os chacos argtentinos e paraguayos, e parte do Uruguay. E ainda guarda várias semelhanças com os povos da planícies do Prata e do Pantanal brasileiro.
Os jinetes e seus caballos (sem sela) pertem de um piquete, ao qual sao mantidos presos até a saída. Vários cavaleiros e ajudantes acompanham o processo e contribuem para amenizar (um pouco) o risco de acidentes e resgatar o jinete.
Não deu pra chegar ao pé da cordilheira, e nem pra escapar da sequidão, mas do pueblito onde acontecia a festa já dava pra ver de longe as pequenas serras que anunciam os Andes. As tardes de domingo, pouco afeitas a surpresas, tiveram neste uma bem vinda exceção...

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Pão de queijo, doce de leite e Serra do Cipó






Emblemática a fronteira GO-MG: tem um riozão marcando a divisa, do lado mineiro já começa o mar de morros e a brisa fresca, e até as vaquinhas brancas e pretas das embalagens de leite substituem bruscamente os nelore cinzentos pouco românticos do Brasil Central. Enfim Sudeste.
OS terrenos sedimentares das chapadas do Brasil Central ficaram para trás, agora quem embasa o relevo e emoldura as cachoeiras são as rochas cristalinas mais duras e antigas. Morros mais agudos, fraturas de rochas mais violentas.De BH a caminho da Serra do Cipó, rios bem encaixados e com água abundante aparecem, mesmo nesta seca que também se manifesta intensa aqui. A menos de duas horas de viagem de BH, o Parque Nacional da Serra do Cipó é destino frequente nos finais de semana dos (?)BeloHorizontinos (mineiros me corrijam se necessário). Mas não deixa de ser menos impressionante.
No sábado passado a idéia era atacar o Cânion do Ribeirão Mascates pelo seu vale, em 25 km de caminhada.Já na entrada do Parque ( e do vale)um grande paredão à leste e uma sequencia de pequenos morros à oeste delimnita e encaixa o vale e não deixa ninguiem se perder, é só ir em frente e chegar ao Canio. Campos, Savanas Rupestres, Matas de Galeria, pequenos riachos e várias misturas entre estas coisas divertem enquanto não chega o canion. De repente a triçha inclina, é pedra sobre pedra, e ele aparece poderoso com suas centenas de metros de altura. O Ribeirão Mascates passa apertado entre os paredões e gera vários pequenos poços de água cristalina e rochas amareladas. POucos caminhantes chegaram aqui (quem veio estava à cavalo ou bike), e para entrar no cânion foi preciso tirar as botas e passar alguns poços com água no pescoço e a mochila suspensa pelo braço trêmulo pelo duplo esforço de suspender com e nadar com o outro. Invariavelmente a recompensa aparece materializada em alguns bons poços e recantos exclusivos.
Recomendo o Parque. As várias maravilhas poder ser exploradas sem guia (recebemos um mapa e algumas recomendações na entrada, e um "Bom Passeio"), a água é abundante e as belezas fartas. Com certeza eu volto.
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Que beleza esta pequena temporada em Minas. Depois de 100 dias e 100 noites sem ver cama nem banho quente foi ótimo desfrutar da Serra do Cipó e da região confortavelmente instalado, comendo farto e na hora certa, podendo escolher cerveja e vinho, e podendo compartilhar a experiencia com uma seleta companhia. A primeira etapa do Navegando vai se encerrar em breve com o meu retorno às origens no oeste do planalto paulistano.

domingo, 12 de setembro de 2010

Navegando pelas savanas centrais...





A vida corre mais rápido que os dedos no teclado... E nas ultimas semanas muita coisa tem acontecido sem que eu pare pra contar.

Nesta noite de domingo escrevo de Natividade, sul do estado de Tocantins, região onde começam as Serras que enfeitam o noroeste de Goiás. Saindo da lan house eu olho pros morros em frente e vejo uma linha brilhante, que eu calculo ter mais de 20 km de comprimento. É o fogo consumindo o cerrado. A cena tem sido comum: desde o sul do estado do Piauí tenho visto centenas de quilmetros de cinzas e toneladas de fumaça subindo. Só aqui no Tocantins está sendo observado um aumento de mais de 5 vezes na área queimada em relação ao ano passado. Consequencia do inverno magro deste ano, pouca chuva, tudo seco. E as perspectivas não são boas para o próximo.Confesso que é mais fácil digerir os números no telejornal do que as sensações que se tem ao andar entre as árvores queimadas ou ver o fogo avançar violentamente sobre áreas enormes e lindas.
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Para vir parar aqui saí do Guriú há dez dias, de carona com o papai que veio do sudeste visitar o filhão. Depois de algumas milhas velejadas com o violento leste desta época do ano partimos para o sul, cortando o Brasil central. Até agora estivemos no sul do Piauí e Maranhão. A idéia é continuar descendo para o sul, a próxima parada será a Chapada dos Veadeiros. Depois parto pra uma temporada no abençoado estado de Minas Gerais, papai volta pra sampa e eu sigo pra Serra do Cipó com uma companhia bem menos barbuda que o coroa... O destino final da etapa continental do Navegando? As cabeças da Patagônia chilena... E depois mais um pouco de vela, sol e mar na Terra da Luz. Antes que alguém me mande trabalhar aviso que estou descobrindo que trabalho é um conceito muito amplo, não podemos reduzi-lo à troca que usualmente se faz entre dinheiro e coisas chatas de fazer...
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Pouca gente sabe mas a savana brasileira, o Cerrado, começa já no sul do Piauí e Maranhão, e em grande estilo. Aqui o cerrado aparece em todas as suas caras (campos, savanas, matas de cerradão), sobre planícies e pendurado nas serras, sobre areia e sobre rocha. Nas matas de galeria que crescem junto aos rios encontrei ontem árvores que ultrapassavam os 20 metros de altura, perfeitamente retilíneas. Em outras regiões nunca vi passarem de 10.
Descobri também as intenções separatistas dos maranhenses desta região: é o Maranhão do Sul, que de fato tem muito mais a ver com o sertanejão de Goiás do que com o reggae de São Luís. São raros os negros na população, predominando os traços indígenas. As diferenças seguem na culinária, sotaque, ecologia e cultura material.
Lá no Ceará já eram frequentes os carros de som com as musiquinhas dos candidatos, aproveitando a melodia de algum dos vários sucessos do (neo)forró cearense. No Maranhão do sul também tinha candidato com musiquinha de forró, mas a maioria já estava adotando o sertanejo. Mas como afinal de contas estamos no Maranhão (ainda que do sul), apareceu um candidato a deputado estadual com uma levada mais reggae, que pegou uma do Bob, deu um tapinha na letra e mandou o som na caixa, heroicamente rebocada por uma valente bicicleta pelas ruas de Riachão...

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Grilo gaiato

Na primeira semana a bordo tive como companhia, das sete as nove da noite, o cricrilar agudo e persistente de um grilo (até onde eu sei apenas os grilos o fazem)que, oculto, dividia a cabine comigo. Suavizados pela distância os cricrilares soam românticos, mas a poucas dezenas de centímetros pode ser enlouquecedor. Decidi conviver em paz com meu inusitado companheiro e logo desisti de tentar encontrá-lo e expulsá-lo. Uma semana depois calou-se meu companheiro, e nunca mais o (ou)vi.
Hoje, abrindo e revirando uma caixa de ferramentas, reencontrei e pela primneira vez vi meu companheiro, que estava surpreendentemente vivo e silencioso.Confesso que fiquei feliz com o encontro e surpreso com o carinho que tive pelo bicho. Não obstante, convidei-o gentilmente a entrar em meu punho fechado e a voltar ao seu habitat convencional, há algumas boas dezenas de quilômetros do seu porto de embarque.Espero que tenha dado tudo certo com ele.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Guriú






Deitado no tucum armado na varanda da minha casa no Guriú,olhando o quintal de cajueiros e o mar ao fundo, finalmente dá pra escrever com calma.
Depois de quarenta dias e quarenta noites vividos nos dez metros quadrados do barco o estado mental e as decisões estratégicas estavam sendo cada vez mais influenciados pelo stress agudo e natural da sobrevivência e da navegação difícil: ficou claro pra mim que era hora do repouso. Consegui.
O Guriú é um povoado de poucas centenas de casas que fica no encontro do rio homônimo com o mar, dez quilômetros à oeste de Jericoacoara. Entre Jeri e Tatajuba e à sombra destes destinos, o fluxo turístico no local se limita a passagem obrigatória dos veículos sobre o canal de maré, feita em balsas similares à jangadas, conduzidas por jovens locais com a ajuda de longas varas de pau do mangue. A vila fica entre as dunas e o canal de maré, perto do manguezal sucumbindo ao soterramento pela areia trazida pelo vento leste, marca registrada do local.
A condição geográfica, ecológica e sociocultural do Guriú o fizeram muito interessante para uma estadia em terra: porto bom, seguro e abrigado, alta diversidade de ambientes a explorar (oceano, canal de maré, rio, manguezais, salgados, carnaubais, dunas, matas de restinga), fartura de pescados, cultura de pesca e navegação tradicional rica e diversa, e uma postura generosa, amigável e respeitosa da população.
Diante da possibilidade de ocupar uma casa bastante agradável, generosamente cedida pela família do pescador Jorge, me instalei, e já estou em terra há boas semanas, repousando no tucum do alpendre, caminhando pelas matas, praias e dunas, comendo muito peixe fresco e saboroso, acompanhando os nativos em suas atividades, fazendo manutenção do barco.
Na entrada da barra o prático contratado se mostrou bem pouco prático, e o barco bateu violentamente com o fundo na passagem rasa e com ondas fortes. As pancadas surdas e os estalos lúgubres me fizeram achar que de fato era o fim. Pular na água, com água pela cintura, empurrar o barco para dentro da barra a cada onda que o suspendia, aguardar a pancada com o fundo e torcer pra passar logo sobre a croa foi o que deu pra fazer, e deu certo. Já nas águas calmas do canal uma meia dúzia de canoas à vela esperava a maré subir um pouco mais pra chegar ao povoado.
Ofereci reboque às canoas, e quando a maré encheu entreguei o leme a um dos pescadores e me concentrei em retirar a água que já batia no volante do motor. Em poucos minutos o pequeno bote a vela fundeava no porto do Guriú, seguido pelo cordão de canoas coloridas...
As velas azuis do Estrela e o seu comandante já eram conhecidos dos locais do Guriú, que acompanharam, nos dias anteriores, com a natural supresa, as minhas tentativas de entrar na barra, as desistências e o retorno à Jeri com o duro leste na cara. E eu com igual supresa fiquei sabendo que nas duas tentativas estive bem à frente das entradas corretas.

Fotos: Pescador varejando canoa no Rio Guriú; Dunas estiradas entre a vila e a barra do guriú; Árvores de mangue sendo soterradas e asfixiadas por areia das dunas; Canoas no porto do Guriú e o habitual enxame de compradores de peixe na chegada de uma; Vista da barra do Guriú , em primeiro plano vários pés de ciúme, planta exótica e invasora (!)

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Barra pesada


Mais alguns dias em terra na Jeri, rede armada em casa de amigos. Diariamente esperar a maré seca para ir à bordo, e quando a maré não está tão seca assim nadar bastante, as vezes com alguma coisa suspensa em uma das mãos pra não molhar. Depois, escalar o costado para subir a bordo, tarefa nem sempre fácil.
Tirar a água que já começa a entrar pelas costuras do casco, bem sacudidas pelo peso do mar e do vento dos ultimos dias e pelas pancadas no fundo da "marina" da Jeri. Organizar velas, cordas, roupas e equipamentos, jogar água no convés. Voltar para terra, buscar alimento, abrigo.
Nos planos a próxima parada é Mangue Seco - Guriú, que ficam a umas 7 milhas à oeste. Destino desejado porque tem porto bom, abrigado e peixe farto, temido porque acessível apenas por uma barra rasa e perigosa.
Suspendi os ferros e parti para um reconhecimento da Barra do Guriú na quarta pela manhã, vento favorável e brando, amarrei o leme e a escota da vela e pude passear a vontade pelo barco enquanto o "piloto automatico" cuidava do rumo. Gostei da brincadeira.
Pouco depois, como de costume, o vento endureceu e com ele o mar e a velocidade. Já se via as pequenas casas do Mangue Seco, o que parecia ser a barra se aproximava, o ponto no GPS, tomado da carta nautica, estava errado, agora tinha que ser tudo no visual. Chegando mais perto as ondas já começavam a arrebentar e o barco já galeava o suficiente pra eu ter que me agarrar na borda enquanto escutava as coisas todas chacoalhando sob o convés. Onde deveria ser a barra se viam finas linhas brancas de arrebentação sobre um mar amarelo: estava raso, perigoso, se encalhasse ali seria moído pelas ondas e pela areia em alguns minutos. Decidi voltar.
Agora era o mar e o vento batendo de frente. Tinha que ligar rápido o motor, enrolar e baixar velas e mastre e sair rápido dali, tudo isso sobre ondas, sob vento, balançando violentamente e frequentemente banhado por sprays de água salgada. No fim deu certo, consegui soltar a vela da retranca, enrolar no mastro, tirar o mastro e amarrar na borda, tudo com o motor ligado. Ainda bem que eu ja estava literalmente com a faca nos dentes, um dos nós que prendia a vela à retranca estava muito apertado e impedia todo o processo, a lamina resolveu facil. Depois disso duas horas e pouco de pilotagem contra o mar e o vento, e eu estava de novo na Jeri.
Achei que era a maré que nao estava alta o suficiente, hoje tentei de novo, e tudo igualzinho: velada mansa pra ir, barra complicada, retirar vela e mastro no alvoroço e voltar contra o vento.
Tudo isso tem me dado muito trabalho, seria mais facil por terra, a pé, nestes tempos muitas vezes tenho pensado em terminar a empreitada náutica: voltar pro Acaraú, vender a canoa e continuar por terra. Vida normal, casa normal, chegou a hora?
Hoje, exausto da volta, no barco, esperando a mare baixar pra ir pra terra, uma das velozes canoas nativas aproou para mim e foi chegando, sinalizaram pra terra, eu confirmei, encostaram e embarquei pra terra.
Contando a minha desventura, perguntei se conheciam um prático pra me ajudar a entrar no Guriú, tinha um a bordo, amanhã vamos sair as 9. Na conversa mais várias informaçõpes e histórias interessantes. Um dos pescadores me pergunta se a policia me pegou mesmo. Explico: invariavelmente as comunidades portuarias (pescadores, carpinteiros, desocupados em geral) acreditam piamente que sou algum tipo de criminoso, ou traficante, ou fugitivo. Como assim, um gringo viajando sozinho de barco, nao pesca, entra e sai do barco frequentemente com sacolas e mochilas suspeita? Pra apimentar alguem havia inventado um boato que eu havia sido pego por uma das trollers da policia militar que patrulham a Jeri, e é claro, o boato pegou. Achei graça.
Chegando em terra um por do sol incrivel, um bom banho de agua doce, agora agradavelmente instalado em uma poltrona a beira mar, escutando excelente musica brasileira ao vivo, conectado via rede wireless, esta é Jericoacoara...
Amanhã parto as 9 pro Guriú com meu prático Adriano. Talvez eu demore um pouquinho mais pra vender a canoa...

Camping nas lagoas azuis



As noites dormidas sobre as firmes margens da Lagoa da Jijoca compensaram o trabalho de transição do barco para a terra. Além do bom sono, a água limpa, doce e azul serviu pra muito banho e inusitadas remada de caiaque e velejada de jangada.
Lagoas desse tipo e dessa coloração são frequentes na zona costeira que vai de Jijoca de Jericoacoara até Camocim.São formadas pelo armazenamento da água da chuva entre as dunas, ou mais raramente pelo represamento de rios costeiros pelo avanço das dunas (nesta região o avanço das dunas é perpendicular à linha de costa, portanto o fenomeno do barramento natural de rios).

A reduzida quantidade de nutrientes na água e o tamanho relativamente grande das partículas da areia mantém a água cristalina, especialmente logo depois que termina o inverno (estação das chuvas, aqui de fevereiro a maio-junho). Ao longo do verão muitas desaparecem.
São um excelente contraponto às agitadas e turvas águas das praias da Jericoacoara, e devidamente exploradas pelos empreendimentos turísticos. Nos pontos mais interessantes e acessíveis há várias barracas de praia, com as típicas redes e mesas dentro da água.
O banho é excelente, a água deixa a pele e cabelos agradavelmente limpos.
Na volta foi duna atrás de duna, lagoa atrás de lagoa, vinte e poucos km embaixo do sol cearense, com pouca água. Divina providência: um sítio de coqueiros sendo soterrado pelas dunas, cocos que estariam a quinze metros de altura ao alcance das mãos! A maré que subia ainda deixou cruzar o Serrote pela praia, no meio da tarde de volta a vila pra comer alguma "comida de panela" como dizem aqui, e encontrar uma árvore pra amarrar a rede.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Na tal da Jericoacoara


Tarde de sábado na Duna do Pôr do Sol: ritual obrigatório com companhia garantida !

A primeira coisa que tem que dar certo em uma viagem é acertar o caminho. Pra Jeri é fácil, o Serrote da Jericoacoara (Serrote = diminutivo de Serra), com sua boa centena de metros de altura, pode ser visto a mais de vinte milhas de distância. Duas horas depois de partir do Acaraú já deu pra desligar o GPS e aproar praquela manchinha avermelhada no horizonte.
O brando sudeste da manhã foi o combustivel do primeiro trecho e em seguida o duro leste entra com tudo, a velada fica esportiva: ondas de mais de tres metros, o mar repleto de carneiros e a velocidade oscilando pelos 6 nós. O barco fica pequeno e nervoso, é preciso fazer força no leme e ter atenção constante, a cada onda cuidar de manter o barco aproado, expor o costado lateralmente a uma onda deste tamanho, com este vento pode emborcar a canoa. A primeira meia hora foi pura emoção, as outras 4 e meia trabalho duro. Enfim dobrar a Ponta da Jericoacoara e entrar na pequena enseada a sotavento do Serrote, o porto da Jeri.
Interessante e surpreendente encontrar este pólo de globalização e infra estrutura entre tantas pequenas praias de turismo local da costa oeste cearense. Jericoacoara impressiona pela heterogeneidade de belezas naturais, pelo volume e composição dos turistas e da infra estrutura turistica.
E decepciona pela qualidade do porto: raso e desabrigado, me obrigou a fundear longe da praia. Com água pela cintura desembarquei e consultei os pescadores locais sobre eventuais "marinas" (porções da praia mais abrigadas, onde os barcos podem encalhar na maré baixa sem bater muito o casco no fundo).
A marina ajudou mas nao resolveu: de dia ficou mais facil chegar e sair da praia, a noite impediu o sono. Fortes solavancos do casco batendo no fundo, e depois, no seco, o barco fortemente adernado por causa da quilha (imagine sua cama chacoalhando a noite inteira e parando na madrugada, mas inclinada a quarenta e cinco graus...).
Depois de 6 horas de vela intensa, um porto desses e uma noite dessas, evidentemente comecei o dia com a firme resolução de vender a canoa e voltar pra casa. Demorou um pouco mas depois de um capuccino e um legítimo pão italiano desisti de vender a canoa e me satisfiz em montar uma mochila de ataque para passar uns dias em terra...

segunda-feira, 26 de julho de 2010

E la nave va...


Depois de algumas boas milhas velejadas em uma ensolarada manhã de domingo senti o casco arrastando no fundo e as velocidade caindo rápido no GPS: surpresa, um banco de areia apareceu embaixo do meu barco! Esse litoral é realmente um mistério, e entrar e sair pelas barras na maré seca ou vazante é certeza de emoção.
A areia aqui é sempre abundante e soberana, nas dunas e no fundo do mar, e assim como as dunas seguem o capricho dos ventos o relevo submarino é moldado pelas correntes marítimas e pelos rios que chegam. Por exemplo, a areia vai se acumulando ao longo da foz mar adentro, produzindo canais e bancos de areia. Essa dinâmica é muito ágil, em poucas semanas canais podem mudar de lugar e as "croas" (bancos de areia) podem aparecer e desaparecer. Esse movimento é atentamente observado pelos povos do mar e presença certa nas rodas de conversa: na última o seu Zé contava que quando ele era jovem o mar batia na porta da casa dele, e hoje são dez minutos "de pés". O rio que desemboca na praia onde ele vive (Praia do Monteiro) foi despejando areia ao longo do tempo e construindo novas áreas, que por sua privilegiada localização às margens do mar e do rio foram prontamente ocupadas por novos moradores e barracas de praia.Inclusive a barraca onde ele me contava esta histórica estava justamente sobre a parte mais jovem destas novas áreas.
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Tive sorte e encalhei em águas relativamentecalmas. Um evento de encalhe como esse, am águas agitadas, pode destroçar qualquer embarcação. O balanço das ondas, quando as águas estáo rasas, levanta o casco, que despenca e bate com todo o seu peso sobre sobre o fundo. O resultado pode ser a abertura das costuras da calafetagem do casco, e ai a água entra, ou a destruição total da nave. No domingo quando a maré começou a encher foi meio tenso, quando o casco começou a bater no fundo me lancei à água pra empurrar a proa sobre o banco a cada onda que a levantava para que ela pousasse um pouco mais suavente. Experiencia interessante esta, meia tonelada de madeira e ferro arfando a cada onda, eu com água no peito amparando a proa pra amenizar a queda. Segurei o que pude pra deixar a maré encher o máximo possível. Já tinmha deixado tudo arrumado pra partir à pano, aí quando não dava mais foi só alegria, com mais uma meia hora de vela cheia eu ja estava fundeado na Croa Grande.
Nas várias horas de espera no seco deu tempo pra tudo: fazer a barba, reparos na embarcação, preparar o almoço, tomar água e comer um coco e receber a visita de um pescador que encalhou algumas centenas de metros de mim.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Um novo ponto de vista...


Em repouso, na barra da Croa Grande, esperando a maré subir pra partir pra Barra do Acaraú

Depois de algumas semanas calafetando e pintando o casco, fazendo pequenas obras de carpintaria e construindo novos mastro e vela finalmente a Estrela voltou as águas e já há uma semana virou a minha casa.
Este veleiro de 21 pés é uma embarcação típica da zona central da costa norte (oeste do Ceará, Piauí e leste do Maranhão). Foi construida com técnicas artesanais por um mestre de Acaraú e utilizada por um ano na pesca oceânica. Esse tipo de embarcação é localmente conhecida por Canoa Costeira, com muita inspiração da Biana do Maranhão.
É uma nave sui generis. Reúne características bastante tradicionais, como a proa em espelho (plana), mastro composto por várias peças (unidas por grossos fios de nylon) e vela artesanal de tecido com um desenho de casco bastante similar aos veleiros modernos. A quilha é longa (se estende da proa à popa), caracteristica fundamental de segurança nas águas rasas daqui, e que permite manobras legais como embarque e desembarque direto em terra.
Ontem estreei plenamente o conjunto completo de velas e a mastreação nova em um vento leste meio intenso,uma certa adrenalina ficar desviando dos imensos currais de peixe e bancos de areia oceanicos no contravento, a quase 7 nós nas rajadas de popa, bastante razoável para embarcações a vela deste porte ( a velocidade média de cruzeiro nas condições do sudeste varia entre 3 e 8 nós por exemplo
).
Agora estou dando um trato no convés e construindo uma vela de estai (aquela da frente) maior e mais colorida pra viajar mais um pouco.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dunas e falésias...

Nas águas costeiras aqui, mesmo estando a quilometros da costa, a profundidade pode ser menor que um metro, sendo frequentes os bancos de areia e os perigos à navegação.Alguns quilometros continente adentro tudo é também muito plano, resultado de uma longa historia de deposição de sedimentos que vieram das serras, morros e chapadas que limitam o Ceará. Juntando a esse quadro os vários eventos de mudanças drástica no nível dos oceanos ao longo das ultimas centenas de milhares de anos se produziram as dunas e falésias típicas do nosso litoral.
A ação das ondas desgasta os extensos tabuleiros de rochas sedimentares moles que embasam o relevo aqui, originando neste desgasta as falésias coloridas e muita areia. Á medida que o nível do mar varia,o relevo muito plano expõe ou submerge grandes extensoes de "terra" (na verdade areia). A areia exposta é carregada pelos fortes e constantes ventos de SE-NE formando as abundantes dunas costeiras.
No detalhe da falésia os seixos denunciam que ali mesmo já foi o médio curso de um rio caudaloso.





A plataforma continental rasa e plana aparece nesta maré baixa, em uma praia " seca": é preciso andar quilometros para chegar à água



Panorâmica do complexo dunar da Ponta Grossa: a direção predoiminante dos ventos (leste)é perpendicular as estrias formadas na areia. Ao fundo o avanço das dunas sobre a vegetação.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Felizes circunstancias...

Agora compartilhando com os amigos um pouco do que eu tenho visto e vivido por aqui !
Nesta postagem algumas imagens de tres dias caminhando pelo extremo leste da costa cearense, entre dunas, falésias, praias e restingas, em uma pequena aventura que começou em Canoa Quebrada e foi até Icapuí, no limite com o RN. 3 dias e 3 noites outdoor, umas 15 léguas.Enormes falésias coloridas moldadas em formas surreais pelo mar e pelo vento, uma tecnologia de navegação a vela tradicional muito sofisticada, muitas algas chegando nas praias.









Esta é com a luz da Lua, bastou botar a cara pra fora da barraca.


No nascer do sol da quarta feira passada também bastou botar a cara pra fora da barraca...